Por
vezes digo aqui: "Este é um filme a não perder". Hoje direi que "Sono de Inverno", do turco Nuri Bilge Ceylan, é um filme a perder por todos
aqueles que se sentem insafisfeitos caso o enredo não obrigue a ver um
grande número de imagens por minuto, ou para aqueles que sentem os
diálogos como espaços de monotonia e quebra no desenrolar da ação. "Sono de Inverno" dura mais de três horas e tem longos diálogos onde se
esgrimam ideias de não fácil digestão.
Aquela
vastidão de beleza natural que é a Capadócia no verão, no inverno dá
lugar ao espaço intimista do interior de uma casa tradicional onde três
fortes personalidades coabitam, e os conflitos interiores extravasam, a
aparente harmonia é quebrada ainda que as longas conversas de opiniões
antagónicas decorram sem grandes gritos; o drama é interno, como o são
todas as mais profundas vivências na solidão de cada um de nós.
Um
filme não aconselhado ao grande público, um filme a ver a sós e a ser
discutido em grupo; um filme a digerir a longo prazo, de uma beleza onde
a palavra, por vezes, se sobrepõe à excelente fotografia, em que um só
rosto nos preenche e que sobressai no negro do ecrã através de um jogo
de sombras e luzes.
Um
filme de retratos psicológicos, de pessoas, de contradições; de olhar o
outro enquanto ser único, mas grande como todos os demais,
independentemente da idade ou qualquer outra forma de catalogação. Um
filme em que a estética e o ser humano são o epicentro, onde a Capadócia
dos turistas (e de mim falo) desaparece. Um filme de atores com um desempenho excecional do ator principal: Haluk Bilginer.
Um filme longo, mas sem tédio; um filme a
saborear tal como a vida: com intensidade, com tempo para observar os
pormenores, com tempo para ouvir e sentir o que há em nós, com tempo
para dar e receber a companhia do outro, para o compreender; com tempo para absorver a beleza dos espaços
físicos.
Um filme a rever, por mim.
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